AS PESQUISAS COMO FORMA DE DESINFORMAÇÃO LEGITIMADA PELA JUSTIÇA ELEITORAL.
Autor: Alexandre Basílio.
A presente análise trata da pesquisa
eleitoral registrada no sistema PesqEle do Tribunal Superior Eleitoral sob o
número 01355/2022, cuja responsabilidade foi atribuída à empresa AUGUSTO DA S.
ROCHA EIRELI, também identificada como AR7 Pesquisa de Opinião e Consultoria
Estatística.
Antes de examinar os requisitos legais e
os aspectos metodológicos relacionados ao registro da pesquisa, impõe-se
destacar inconsistências de natureza estrutural que, dada sua gravidade, devem
sempre ser levadas ao conhecimento do Ministério Público Eleitoral e, em casos
específicos, da Polícia Federal para continuidade das investigações.
Tais inconsistências dizem respeito ao
cumprimento das obrigações previstas pela Resolução TSE nº 23.600/2019,
especialmente quanto à regularidade do cadastro das entidades que realizam
pesquisas eleitorais no Brasil.
Nos termos do art. 5º da referida norma, é
obrigatória a inserção, no sistema PesqEle, das informações constantes dos
incisos I a IX, como condição para o processamento do registro. Entre os dados
exigidos, merecem destaque o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa
Jurídica (CNPJ), previsto no inciso III, e o endereço completo para recebimento
de notificações e comunicações processuais, conforme disposto no inciso VII e
nos §§ 4º e seguintes do art. 13 da Resolução, bem como na norma que regula as
representações, reclamações e pedidos de direito de resposta.
Entretanto, conforme revelado por
reportagens da imprensa nacional e confirmado por meio de análise documental, a
empresa responsável pela pesquisa de número 01355/2022 não observou de forma
satisfatória tais exigências. As imprecisões constantes nos dados apresentados
ao sistema da Justiça Eleitoral fragilizam a credibilidade do levantamento e
suscitam sérias dúvidas quanto à lisura de sua execução.
O responsável técnico e proprietário da
empresa é o Sr. Augusto da Silva Rocha, que registrou sua empresa na Receita
Federal sob o CNPJ nº 29.833.202/0001-04. Consta como endereço da pessoa
jurídica o imóvel localizado na Rua Jaboticabal, nº 98, bairro Vila Bertioga,
município de São Paulo.
Não obstante, verifica-se a existência de
divergências relevantes entre as informações constantes nos cadastros oficiais
e aquelas informadas no momento do registro da pesquisa perante a Justiça
Eleitoral, como se observa das imagens seguintes.
Note que a partir do site da Receita Federal
é possível analisar os dados da pessoa jurídica registrada. Observem o endereço
oficial da AR7 Pesquisa de Opinião e Consultoria Estatística:
Foi realizada a
verificação do endereço que, nos termos da Resolução TSE nº 23.600/2019, deve
ser obrigatoriamente informado para fins de eventual solicitação de acesso aos
dados internos da pesquisa.
A localização
indicada foi consultada por meio do Google Maps, sendo possível visualizar o
imóvel no seguinte link:
Clicando na URL informada, chega-se à seguinte imagem do local vinculado ao endereço cadastrado pela empresa responsável pela pesquisa eleitoral: trata-se de uma residência simples, sem qualquer identificação que indiquem o funcionamento regular de empresa dedicada à realização de pesquisas de opinião ou à prestação de serviços estatísticos.
Observa-se que o número 98 corresponde, na verdade, ao pavimento superior de um estabelecimento comercial — especificamente, uma padaria localizada no térreo. Para dar maior respaldo à análise e contextualizar adequadamente a estrutura física do local indicado, apresenta-se, a seguir, a visualização do imóvel por outro ângulo, obtida também por meio do Google Maps.
A partir da análise do endereço
cadastrado, adotou-se uma prática comum na investigação de empresas com
indícios de irregularidade: a verificação da existência de outras pessoas
jurídicas registradas no mesmo local.
A consulta revelou que, no mínimo, dez
empresas estão formalmente domiciliadas nesse endereço. Ressalte-se que a busca
foi interrompida após a décima identificação, diante da constatação de que a
quantidade de registros ali concentrados era significativamente superior,
sugerindo tratar-se de endereço utilizado como domicílio fiscal de múltiplas
empresas, prática frequentemente associada à constituição de pessoas jurídicas
de fachada.
Abaixo seguem os documentos das empresas
que, em tese, funcionam no mesmo endereço:
Diante dos indícios de irregularidades já
apontados e da ausência de informações obrigatórias exigidas para o correto
preenchimento do sistema PesqEle, nos termos do art. 5º da Resolução TSE nº
23.600/2019, impõe-se questionar a própria legitimidade e autenticidade do
registro da empresa AUGUSTO DA S. ROCHA EIRELI / AR7 Pesquisa de Opinião e
Consultoria Estatística junto à Justiça Eleitoral.
A gravidade dos elementos identificados
permite cogitar, inclusive, a invalidade das pesquisas eleitorais registradas
por essa pessoa jurídica no ano de 2022, hipótese que pode ser objeto de
provocação formal dirigida ao Tribunal Superior Eleitoral por partidos
políticos ou pelo Ministério Público Federal.
Além dos fortes indícios de que se trata
de uma empresa de fachada, merece especial atenção o fato de o capital social
declarado ser de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Tal dado, por si só, não
ensejaria suspeitas, não fosse o volume e a abrangência dos registros
realizados no curto intervalo dos sete dias considerados nesta investigação.
Entre os dias 17 e 24 de setembro de
2022, a empresa cadastrou, no sistema PesqEle, um total de 17 (dezessete)
pesquisas eleitorais, distribuídas por diferentes regiões do país, todas
declaradamente custeadas com recursos próprios. A dimensão da operação e o seu
financiamento exclusivo sem contratação por terceiros reforçam a necessidade de
apuração rigorosa acerca da capacidade operacional e financeira da empresa.
Observem os dados oficiais:
Destaca-se, ainda, que a referida empresa,
localizada no pavimento superior de uma padaria e que compartilha o endereço
com ao menos outras nove pessoas jurídicas, é responsável pelo registro de 17 (dezessete)
pesquisas eleitorais realizadas em municípios geograficamente distantes entre
si.
Como exemplo, cita-se a pesquisa
registrada no estado do Amazonas em 17 de setembro de 2022 e, posteriormente,
aquelas declaradas nos estados de São Paulo, Pará e Maranhão, todas no dia 24
do mesmo mês. Trata-se de distâncias superiores a 3.000 quilômetros entre
alguns desses municípios, o que impõe um questionamento legítimo sobre a
capacidade operacional de execução simultânea desses levantamentos em campo.
Conforme consta dos registros oficiais,
todas essas pesquisas foram declaradas como custeadas com recursos próprios da
empresa. Assim, no intervalo de apenas dez dias, a pequena pessoa jurídica de
titularidade do Sr. Augusto da Silva Rocha comprometeu-se com despesas
superiores a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) em levantamentos eleitorais em
diversas unidades da federação, sem que se verifique qualquer contratação por
terceiros ou fonte de financiamento externa.
Vejamos a seguir os dados que ilustram
essa operação.
|
Número da pesquisa |
Empresa |
Data do Registro |
Local |
Custo da Pesquisa: |
|
||||
|
AM-01355/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
17/09/22 |
AMAZONAS |
R$ 30.000,00 |
|
||||
|
PA-05811/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
20/09/22 |
PARÁ |
R$ 20.000,00 |
|
||||
|
BR-00865/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
20/09/22 |
BRASIL |
R$ 20.000,00 |
|
||||
|
PA-06644/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
22/09/22 |
PARÁ |
R$ 20.000,00 |
|
||||
|
MA-06953/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
23/09/22 |
MARANHÃO |
R$ 40.000,00 |
|
||||
|
BR-02677/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
BRASIL |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
SP-09754/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
BR-07908/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
BRASIL |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
MA-06697/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
MARANHÃO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
SP-09107/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
BR-07196/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
BRASIL |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
SP-05784/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
BR-09242/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
BRASIL |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
SP-06277/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
SP-02664/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
BR-01564/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
BRASIL |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
P-08473/2022 |
AUGUSTO DA S ROCHA EIRELI / |
24/09/22 |
SÃO PAULO |
R$ 7.000,00 |
|
||||
|
|
|
TOTAL |
R$ 214.000,00 |
||||||
Dispensa-se qualquer juízo adicional
quanto à gravidade dos indícios revelados. É, no mínimo, questionável que uma
empresa registrada em um imóvel situado sobre uma padaria, o mesmo endereço de
outras dez pessoas jurídicas, declare, como recursos próprios, valores
investidos em pesquisas eleitorais que correspondem ao dobro do seu capital
social registrado.
Tal discrepância, associada à dispersão
territorial das coletas de dados e à ausência de contratações por terceiros,
compromete a credibilidade da atuação empresarial e sugere a existência de
irregularidades que demandam apuração imediata.
A relevância do caso também foi percebida
por outros agentes de controle social. O jornal O Globo, ao tratar da
atuação do estatístico Augusto da Rocha, proprietário da empresa AR7 Pesquisa
de Opinião e Consultoria Estatística, registrou o seguinte trecho:
Importa ressaltar que as 17 pesquisas
registradas pela empresa AR7 não são as únicas sob a responsabilidade técnica
do estatístico Augusto da Silva Rocha. O mesmo profissional também figura como
responsável por diversos levantamentos realizados por outras empresas do setor,
como é o caso da J. J. Coelho / Instituto Phoenix & Associados, pela qual
subscreveu, no mínimo, outras 12 pesquisas eleitorais no mesmo período.
Considerando apenas essas duas pessoas jurídicas, constata-se que Augusto da
Silva Rocha acumulava, à época, a responsabilidade técnica por 29 (vinte e
nove) pesquisas eleitorais registradas no Tribunal Superior Eleitoral.
Tal volume de atuação, concentrado em
curto espaço de tempo, não passou despercebido pelas instâncias fiscalizatórias
da própria categoria profissional. A elevada produtividade do estatístico já
foi alvo de críticas e apurações por parte do Conselho Federal de Estatística,
o que reforça a necessidade de maior controle sobre a atuação de profissionais
que operam nesse segmento estratégico do processo eleitoral.
Entretanto, uma questão de ordem lógica
impõe-se: por qual razão alguém custearia e assinaria, com recursos próprios,
17 pesquisas eleitorais, distribuídas por diferentes regiões do país, sem
qualquer retorno financeiro declarado? Que tipo de motivação justificaria
tamanho engajamento sem vínculo contratual ou compensação econômica? Esse
aparente paradoxo foi abordado em investigação jornalística conduzida por O
Globo, conforme se observa a seguir:
Como se depreende da análise acima, o
cenário delineado revela a existência de um verdadeiro leilão de resultados, no
qual os números divulgados nas pesquisas eleitorais são moldados conforme a
conveniência de quem estiver disposto a financiar tais levantamentos. Esse
modelo compromete a integridade do processo democrático e dá ensejo a uma forma
sofisticada de desinformação, chancelada pela própria Justiça Eleitoral ao
deixar de adotar mecanismos efetivos de verificação e controle sobre os dados
declarados pelas empresas responsáveis.
Além das irregularidades formais já
apontadas, especialmente aquelas relativas ao endereço da empresa, à capacidade
operacional e ao custeio incompatível com o capital social declarado,
identificam-se vícios adicionais que, por si só, seriam suficientes para
ensejar a invalidação do registro da pesquisa e sua equiparação a levantamento
não registrado, nos termos da legislação eleitoral.
Nessas hipóteses, a sanção prevista é a
aplicação de multa, cujo valor mínimo é de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil
duzentos e cinco reais), conforme estabelece o art. 18 da Resolução TSE nº
23.600/2019. A seguir, detalham-se os demais elementos que comprometem a
regularidade da pesquisa em questão.
1) Da ausência de informação quanto à
origem dos recursos utilizados na realização da pesquisa eleitoral
A Resolução TSE nº 23.600/2019
estabelece, de forma expressa, a obrigatoriedade de indicação da origem dos
recursos empregados na realização de pesquisas eleitorais, mesmo quando estas
forem custeadas com recursos próprios. Trata-se de exigência voltada à
transparência do processo e à fiscalização da regularidade do financiamento dos
levantamentos de opinião divulgados durante o período eleitoral.
Dispõe o art. 2º da mencionada norma:
Art. 2º Para os fins desta resolução,
consideram-se obrigatórias as seguintes informações:
(...)
II – valor e origem dos recursos
despendidos na pesquisa, ainda que realizada com recursos próprios. (sem
grifos no original)
No entanto, ao se examinar o registro da
pesquisa AM-01355/2022 no sistema PesqEle, constata-se a completa omissão
quanto à origem dos valores empregados. Limita-se o responsável técnico a
informar genericamente o uso de recursos próprios, sem qualquer detalhamento
sobre a fonte, natureza ou lastro financeiro que sustente o custeio da operação
— o que afronta diretamente a exigência normativa e compromete a transparência
e a rastreabilidade dos dados financeiros envolvidos.
A ausência dessa informação impede o controle institucional e social sobre possíveis fraudes, simulações contratuais ou utilização indevida de recursos para influenciar a opinião pública, especialmente em um cenário eleitoral de elevada competitividade. Tal omissão, por si só, configura hipótese de descumprimento da Resolução e fundamenta eventual requerimento de invalidação da pesquisa, com a aplicação das sanções previstas.
2) Da ausência de indicação da área
física de realização da pesquisa no momento do registro
A Resolução TSE nº 23.600/2019
estabelece, como condição indispensável para o registro válido de pesquisas
eleitorais, a apresentação de informações detalhadas sobre o plano amostral.
Entre os elementos exigidos, encontra-se a descrição da área física de
realização do trabalho a ser executado, o que permite aferir a abrangência
territorial da coleta dos dados e a consistência metodológica da amostra.
(...)
§ 2º Para efeito de registro, a proposta
de pesquisa a ser realizada deverá conter:
(...)
IV – plano amostral e ponderação quanto a
gênero, idade, grau de instrução, nível econômico da pessoa entrevistada e área
física de realização do trabalho a ser executado, bem como nível de confiança e
margem de erro, com a indicação da fonte pública dos dados utilizados.
Trata-se, portanto, de vício material
que, além de descumprir frontalmente a norma regulamentar, inviabiliza a
aferição da representatividade da amostra e compromete a transparência e a
legitimidade do levantamento divulgado.
O mesmo estatístico, em outra
oportunidade, cuidou de mencionar a área física de realização do trabalho,
conforme notamos da pesquisa feita por ele, registrada sob o número 05811/2022,
no Pará, na mesma semana:
Prova de que o profissional sabe desta obrigação é que em outra pesquisa o preenchimento dos dados obrigatórios foi observado:
3) Da ausência de inclusão de todos os candidatos
oficialmente registrados no questionário da pesquisa
A Resolução TSE nº 23.600/2019 é
categórica ao estabelecer que, a partir da publicação dos editais de registro
de candidaturas, todas as pessoas oficialmente registradas devem
obrigatoriamente constar na lista de opções apresentada às pessoas entrevistadas
nas pesquisas eleitorais de cunho estimulado.
Dispõe o art. 3º da norma:
A exclusão de um nome validamente
registrado compromete não apenas a fidelidade do levantamento em relação à
realidade eleitoral, mas também pode influenciar indevidamente a percepção do
eleitorado, ao induzir a impressão de que determinado candidato não está mais
na disputa ou não possui relevância eleitoral. Trata-se, portanto, de violação
grave às normas que regulam a realização de pesquisas eleitorais, passível de
ensejar sanções e de justificar a invalidação do levantamento.
A exclusão do nome do candidato Pastor
Peter Miranda do questionário de pesquisa estimulada, referente à disputa pelo
cargo de Senador no estado do Amazonas, não foi o único erro identificado.
Verifica-se, ainda, que o material visual utilizado durante as entrevistas —
comumente denominado disco e destinado à exibição das fotografias e nomes dos
candidatos ao eleitor entrevistado — também apresentou inconsistência
relevante: a ausência da imagem do candidato Omar Aziz, então regularmente
registrado na disputa ao Senado Federal.
Tal omissão fere diretamente o princípio
da isonomia entre os candidatos, além de comprometer a neutralidade e a
confiabilidade do instrumento de pesquisa. A apresentação incompleta dos nomes
e imagens no material utilizado em campo constitui grave irregularidade, apta a
gerar distorções nos resultados apurados e a justificar, por si só, a
desconsideração da pesquisa para fins de divulgação oficial.
A Resolução TSE nº 23.600/2019,
ao disciplinar os requisitos para o registro de pesquisas eleitorais,
estabelece de forma clara a obrigatoriedade de identificação do profissional de
Estatística responsável, exigindo não apenas a indicação de seu nome e número
de registro no Conselho Regional competente, mas também a apresentação de assinatura com
certificação digital, vinculada especificamente à pesquisa
registrada.
O comando normativo está previsto
no art. 2º, inciso IX:
Art. 2º
(...)
IX – nome
da(o) profissional de Estatística responsável pela pesquisa, acompanhado de sua
assinatura com certificação digital e o número de seu registro no Conselho
Regional de Estatística competente.
No entanto, ao se examinar os
documentos anexados ao registro da pesquisa AM-01355/2022, verifica-se que a
empresa responsável apresentou um arquivo com assinatura digital do estatístico
que não
guarda qualquer relação com a pesquisa em análise. Trata-se de
documento genérico, ou mesmo vinculado a outro levantamento, o que evidencia o
descumprimento do requisito normativo essencial.
Tal irregularidade compromete a autenticidade do registro,
pois inviabiliza a validação técnica do responsável pelo plano amostral e pela
metodologia empregada. Além disso, impede a responsabilização do profissional
caso sejam identificadas fraudes estatísticas ou distorções metodológicas,
violando diretamente os princípios da transparência, da rastreabilidade e da
boa-fé no processo eleitoral. Trata-se, portanto, de vício formal e material
apto a ensejar a nulidade do registro e a aplicação das penalidades previstas.
5)
Da falha na complementação dos dados exigidos — pesquisa considerada não
registrada
De forma ainda mais grave que as
irregularidades anteriormente descritas, verifica-se que a empresa responsável
deixou de cumprir requisito essencial à validade do registro, qual seja, a complementação
obrigatória dos dados da amostra, nos termos do § 7º do art. 2º da Resolução
TSE nº 23.600/2019.
O dispositivo assim dispõe:
Art. 2º, § 7º A partir do dia em que a pesquisa puder
ser divulgada e até o dia seguinte, o registro deverá ser complementado, sob
pena de ser a pesquisa considerada não registrada, com os dados relativos:
(...)
IV – em quaisquer das hipóteses dos incisos I, II e III deste parágrafo, ao
número de eleitoras e eleitores pesquisadas(os) em cada setor censitário e à
composição quanto a gênero, idade, grau de instrução e nível econômico das
pessoas entrevistadas na amostra final da área de abrangência da pesquisa
eleitoral.
No caso da pesquisa AM-01355/2022, tal
complementação não foi realizada. A ausência dos dados desagregados por setor
censitário e das informações sobre a composição amostral — como gênero, faixa
etária, escolaridade e nível econômico — impossibilita a verificação da
consistência metodológica da pesquisa, bem como a replicabilidade da inferência
estatística realizada.
Conforme prevê expressamente
a norma, a omissão nesse ponto acarreta a desqualificação do levantamento
como pesquisa registrada, equiparando-o, para todos os fins legais, a uma
pesquisa clandestina, sujeita às sanções previstas, inclusive a multa mínima de
R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil duzentos e cinco reais), conforme dispõe o
art. 18 da mesma resolução. Trata-se, portanto, de vício insanável, que
compromete a validade jurídica e a confiabilidade pública da pesquisa em
questão.
Conclusão
O caso analisado não constitui uma
exceção, mas representa uma prática recorrente no cenário eleitoral brasileiro.
A existência de pesquisas com indícios de irregularidade — seja na origem dos
recursos, na estrutura das empresas responsáveis, na metodologia empregada ou
na omissão de dados obrigatórios — evidencia um modelo permissivo e frágil de
controle, no qual a responsabilidade pela integridade das informações repousa
exclusivamente sobre os entes privados que produzem os levantamentos.
A preocupação se acentua diante da
impossibilidade de atuação proativa por parte da Justiça Eleitoral, que, por
ausência de previsão constitucional e legal específica, não detém
competência para exercer controle prévio sobre o conteúdo das pesquisas
registradas, ainda que estas sejam amplamente divulgadas e interpretadas
pela população como se se tratasse de dados oficiais, legitimados pelo próprio
TSE.
Tal limitação está expressamente
reconhecida na Resolução TSE nº 23.600/2019. De um lado, o § 5º do art. 2º
dispõe que "a integridade e o conteúdo dos arquivos e das informações
inseridos no PesqEle são de inteira responsabilidade da entidade ou empresa
realizadora do registro da pesquisa eleitoral". De outro, o § 1º do
art. 10, incluído pela Resolução TSE nº 23.676/2021, é claro ao afirmar que "a
Justiça Eleitoral não realiza qualquer controle prévio sobre o resultado das
pesquisas, tampouco gerencia ou cuida de sua divulgação."
Esse vácuo institucional acaba por
permitir que levantamentos estatísticos potencialmente fraudulentos circulem
com aparência de legalidade, gerando desinformação e interferindo na formação
da vontade popular. A ausência de mecanismos legais eficazes para impedir ou
corrigir essas distorções coloca em risco a lisura do processo eleitoral e
exige urgente reflexão sobre a necessidade de aprimoramento normativo no
tratamento das pesquisas eleitorais no Brasil, o que esperamos que aconteça com
a chegada do novo Código Eleitoral.