Crônicas de um
assessor.
Autonomia Partidária, Comissões Provisórias e as Convenções para escolhas dos candidatos nas Eleições de 2012.
Ao que parece, o problema do momento
para a Justiça Eleitoral é quanto a regularidade das Convenções Municipais, das
quais depende a escolha dos candidatos para o pleito de 2012. Neste exato
momento em que escrevo, existem vários processos no Tribunal Regional Eleitoral
da Paraíba aguardando a decisão da corte sobre o assunto. Tal decisão pode
influenciar diretamente várias candidaturas, deferindo ou indeferindo a
participação de candidatos ou alterando o tempo de propaganda na TV para cada
coligação.
Para elucidar bem o caso e para
garantir o entendimento do caro e-leitor, é necessário uma breve explicação. As
Comissões Provisórias são representações do partido em âmbito municipal. Cabe a
essas comissões, de forma democrática e seguindo as regras do Estatuto do
Partido, promover as Convenções Partidárias onde serão escolhidos os seus
pré-candidatos.
No âmbito municipal, via de regra, o
responsável por realizar as convenções é o Diretório Municipal. Ocorre que, em
muitos municípios, esse diretório não existe. Nesses casos, o que existe é uma
Comissão Provisória. Essa comissão provisória faz as vezes do Diretório, e,
tecnicamente, em nada se diferencia quanto às prerrogativas para atuar no
micro-processo eleitoral.
Devido aos constantes problemas quanto
ao controle dos integrantes e delegados dos órgãos de direção partidária, o TSE,
por meio da instrução normativa 03/2008, estabeleceu o uso do Sistema de
Gerenciamento de Informações partidárias - SGIP.
Instituído para atender os fins do art.
10 da Lei 9.096/95, e regulamentado pela Res. TSE 23.093/2009, o SGIP passou a
ser de uso obrigatório pela Justiça Eleitoral a partir de 2009, sendo composto
por três módulos:
I – Módulo Interno – SGIPin): de uso
exclusivo da Justiça Eleitoral.
II – Módulo Consulta Web (SGIPweb): disponível na Internet e na Intranet
do TSE – Possibilita o acesso aos dados inseridos no Módulo Interno e permite a
emissão de certidões com certificação ou autenticação digital.
III – Módulo Externo (SGIPex): de uso da Justiça Eleitoral e dos
partidos políticos – Permite aos representantes das agremiações partidárias
enviar à Justiça Eleitoral, pela Internet, os dados de constituição e alterações
dos órgãos de direção partidários, em qualquer âmbito, bem como fazer o
credenciamento e descredenciamento de delegados (nacionais e estaduais) perante
a Justiça Eleitoral.
Após criar o sistema, foram também
criados nomes de usuário e senhas pelo TSE para cada representante do partido.
Em seguida foram eles capacitados para que pudessem operá-lo.
Providenciada a parte administrativa de
uso e concessão de acesso ao sistema, o controle da composição dos partidos
passou a ser realizado de forma totalmente eletrônica. Para melhor compreensão,
basta entender que, todas as informações do Diretório Nacional, Regional,
Municipal e das Comissões Provisórias passou a ser controlado pelo SGIP, e o
funcionamento é simples.
Os partidos, respeitado o âmbito a que
pertencem e, de posse de sua senha, alimentam o sistema com as informações
partidárias. Informações do presidente, vice-presidente, Tesoureiro, vogais e
demais membros que compõem o órgão partidário são digitadas no módulo SGIPex. Incluindo
o início e o fim da vigência daquela comissão e de seus respectivos
representantes, muito embora, infelizmente, o sistema permita que Comissão
Provisória seja anotada com um fim de vigência indeterminado.
Após cadastrada, a informação deve ser
oficializada. Para isso, o responsável partidário que alimentou o sistema,
precisará imprimir um recibo das alterações. Esse recibo é autenticado pelo
sistema com um código de segurança e deve ser assinado pelo Presidente do
Partido ou da comissão naquela circunscrição.
Após a impressão e assinatura do recibo
com as alterações da composição partidária, tal documento deve ser encaminhado
ao Tribunal Regional Eleitoral. Embora a resolução 23.093/2009 insista na
necessidade de se enviar tal recibo para o Juiz Eleitoral da Zona correspondente,
na prática, ele também pode ser enviado diretamente ao Tribunal.
O Tribunal, ao receber tal documento,
oficializa o ato por meio de protocolo. Em seguida, o recibo contendo as
informações é enviado ao Presidente do Tribunal que, verificando a legitimidade
do pedido, sem realizar qualquer juízo de valor, em respeito à autonomia
partidária, manda oficializar as modificações requeridas. A partir deste
momento, as alterações passam a ser oficiais e podem ser requeridas por meio de
certidão eletrônica no módulo WEB do SGIP.
O funcionamento do sistema é primoroso.
A não ser por um pequeno lapso. Devido à ampla liberdade que tem de controlar
suas questões internas, fruto das garantias oferecidas pelo art. 17 da
Constituição Federal, podem, os partidos políticos, alterar como bem entenderem
essas informações partidárias. A Justiça Eleitoral não faz qualquer verificação
da veracidade de tais informações. Apenas confere a autenticidade. Ou seja,
apenas verifica se as alterações foram realizadas por quem tinha permissão. Se
a alteração é legal, ou não, pouco importa.
Cito a questão da legalidade, pois, por
ser excessivamente ampla a liberdade de os partidos manutenirem suas
informações, vez por outra, ocorrem excessos.
Tomemos como exemplo o notório caso de
um partido em João Pessoa. O partido X.
O presidente do partido comunicou aos
seus filiados que no dia 30 de junho de 2012 ocorreria a convenção para escolha
de candidatos e para discussão sobre a possibilidade de coligações. Tudo transcorria com
naturalidade. A convenção ocorreu, os correligionários votaram e decidiram que
o partido X deveria se coligar com o partido Y, oferecendo candidato ao cargo
de vice-prefeito da coligação.
A efêmera normalidade se esvaiu, pois,
determinada ala do partido, ao tomar conhecimento das intenções de o partido X
coligar-se ao partido Y, tramou uma jogada de mestre. Acessaram o sistema
SGIPEX no dia 29 de junho, às 21 horas e, em seguida inativaram o presidente,
vice-presidente e tesoureiro da Comissão Provisória à frente da convenção.
Feito isso, no dia seguinte, tratou de realizar, também, uma convenção para
estabelecer coligação com o partido W.
Cumpridas as exigências legais de
escolha de pré-candidatos por meio de convenção, apresentaram, no dia 5 de
julho, o requerimento de registro das candidaturas, também chamado de DRAP -
Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários.
A ala 1 do partido X coligara-se com o
partido Y. A ala 2 do partido X, coligara-se com o partido W.
Munidos de documentos e certidões,
estabelecia-se, naquele momento, o conflito de interesses qualificado por uma
pretensão resistida, carinhosamente chamada de lide.
A ala 1 do partido X juntara certidões,
comprovando que, no dia da convenção, o presidente da Comissão Provisória e,
portanto, responsável pela convenção, era o Sr. João. Provou tudo por meio de
certidões tiradas do módulo Web do SGIP.
A ala 2 do partido X fez o mesmo.
Provou, juntando certidões do SGIP, que no dia da Convenção o presidente do
partido era o Sr. Zé.
A essas alturas, juízes, promotores,
advogados e demais servidores da justiça eleitoral não compreendiam mais a quem
favorecia a razão. Como pode a Justiça Eleitoral oferecer certidões
contraditórias, perguntou a promotora.
- Impossível... encaminhe cópia dos
autos à Polícia Federal, há alguma fraude - posicionou-se o juiz.
O fato é que, simplesmente o Sistema de
Gerenciamento de Informações partidárias, permite, inclusive, que sejam feitas
alterações retroativas quanto ao prazo de vigência do mandato do presidente das
comissões e demais membros. Portanto, ambas as certidões eram válidas e
verdadeiras.
Se ambas eram verdadeiras, qual ala do
partido teria razão?
Simples! Basta verificar o que diz o
art. 2º da Res. TSE .23.373/2011, in verbis:
Art. 2º Poderá participar das eleições o
partido político que, até 7 de outubro de 2011, tenha registrado seu estatuto
no Tribunal Superior Eleitoral e tenha, até a data da convenção, órgão de
direção constituído no Município, DEVIDAMENTE ANOTADO no Tribunal Regional
Eleitoral competente (Lei nº 9.504/97, art. 4º, e Lei nº 9.096/95, art. 10,
parágrafo único, II).
Basta lembrar que, ainda que o partido
tenha ampla liberdade de realizar as alterações no sistema, elas precisam ser
validadas pela Justiça Eleitoral. Ao validar as alterações, o Presidente do
Tribunal determina que elas sejam oficializadas, propagando seus efeitos a
partir do exato momento em que foram protocolizadas junto ao Tribunal.
Para a solução do caso, bastou verificar
que a única Comissão Provisória validamente anotada junto ao Tribunal, no
momento da realização da convenção, era aquela cujo o Sr. João era presidente.
A Convenção realizada pela Ala 2 do partido, era ilegítima, pois, embora
houvesse sido modificada, só seria anotada 2 dias após a convenção, a partir de
quando expediria certidões informando o conflito de datas e de presidentes.
Explicado o funcionamento do sistema,
concluiu de forma brilhante o seu voto, o relator:
“Voto pelo desprovimento do recurso
para validar a coligação entre o partido X e Y, tudo como diz a lei, em
harmonia com o parecer Ministerial.
É como voto, senhor Presidente,
Publique-se,
Registre-se,
Intimem-se.”
João Pessoa - Eleições 2012.
Alexandre Basílio
Assessor da Procuradoria Regional
Eleitoral da Paraíba.
Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba.
Professor de Direito Eleitoral do Curso
de Formação de Oficiais da Polícia Militar Paraibana.
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